Por que alguns casais se recuperam de uma traição e outros, não?
05-03-2019 19:07Falar em traição pode mexer com um dos medos mais profundos de alguns casais.
Falar em traição pode mexer com um dos medos mais profundos de alguns casais. Para aqueles que passaram por essa situação, o problema maior é o que vem depois: o relacionamento precisa acabar? Será que tem chances de ser reconstruído? Há quem leve uma traição a ferro e fogo: se foi infiel, não há motivos para continuar junto. Mas alguns resolvem tentar novamente, inclusive frequentando sessões de terapia para casais --o que não significa que haverá sucesso. Afinal, por que há parceiros que conseguem deixar essa parte de sua história para trás, e até mesmo encaram a traição como uma maneira de fortalecer o casamento antes estremecido, enquanto outros preferem seguir caminhos diferente.
O psicólogo e psicoterapeuta de casais Vitor Sampaio acredita que é preciso ver a traição com outros olhos antes de tudo. "Cada casal é único. Eles têm suas regras e seu jeito. Então, há casais que consideram até um olhar para o lado uma traição, e outros que acham que só a conjunção carnal é sinônimo de trair. O importante é tentar entender o que é traição para eles, o que levou um parceiro --ou os dois-- ao ato, e saber a disponibilidade de superar a traição", explica. Para ele, o ato de trair é só uma "ferida", e pensar somente na traição simplifica demais a situação --por isso alguns casais não conseguem continuar juntos. "Precisamos tirar parar de falar que quem trai é canalha.
Qual é a minha disponibilidade para olhar para a pessoa como quem ela sempre foi: aquele que eu amo, que me faz bem, apesar da traição? Se o casal se debruçar sobre isso, crescer junto, incluir experiências boas de ser casal, o 'buraco' que a traição traz vai diminuindo", diz.
Traição só ocorre quando tem um problema?
Um dos grandes estereótipos envolvendo a infidelidade tem a ver com a culpa de "ter deixado a relação ruim". Nem toda pessoa que trai o faz porque o relacionamento vai mal, explica a psicóloga clínica e terapeuta de casais Marina Simas de Lima.
Essa traição pode acontecer por vários motivos, inclusive porque o par acha que há uma monotonia sexual: o objeto de desejo, que é o parceiro fixo, nesse caso, já está totalmente conquistado. Uma pessoa nova traz mais estímulo", afirma. E há também uma hipótese bem comum: a pessoa, por mais que esteja comprometida, simplesmente sentiu desejo por outra --e isso pode não ter nada a ver com o relacionamento que ela mantém.
O que pode, de fato, ser um empecilho na busca pela reconciliação é a necessidade emocional de cada parceiro ou parceira: enquanto alguns estão satisfeitos com a segurança que o relacionamento estável traz, outros podem também ter um desejo de aventura mais forte, o que pode ser um conflito para casais monogâmicos.
Vejo muito aquelas pessoas que querem desafios, que sentem falta da conquista, mas que também querem a segurança da relação. Fica muito difícil unir tudo isso na monogamia", pensa Marina.
Como superar e, talvez, reconstruir a relação.
Regina Truffa, psicóloga do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e terapeuta de casais e de família, crê que uma traição nem sempre é um mal para o casal --ela pode, inclusive, ser uma força para recuperar a relação.
O casal que se recupera é aquele que conseguiu trabalhar as questões essenciais do casamento: qual a minha parte aqui? Como eu contribuí para a relação? Como eu me coloco frente ao outro? São coisas assim que precisam ser tratadas", diz. "Não podemos desvalorizar a dor do outro. E é preciso ter muito autoconhecimento e reaprender a se divertir com o parceiro --não somente sobreviver no casamento".
Marina acrescenta que é preciso falar muito, principalmente na etapa de reconstrução da confiança. "E tem que falar a verdade, mesmo que ela possa machucar. As pessoas precisam lidar com a forma que o outro vê tudo que tem acontecido para que se abra um diálogo, assim a memória da traição fica pequena.
Vitor ressalta que um casal que chega à terapia já com objetivo de continuar junto pode se decepcionar. "A terapia é um cuidado do modo como esse casal está junto, e cuidar para saber se eles ainda podem ficar juntos. Nem sempre significa que recuperar a relação é a melhor solução. Precisamos refletir sobre as certezas que cresceram com a gente, para saber se vale a pena separar ou não", diz.
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